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Conto de Natal
Navegador n.º 177 - Dezembro de 2007

     Era Dezembro, chegara a África poucos dias antes do Natal de 1969, com duas filhas bem pequenas que vibravam com o Natal, com o presépio e com Jesus nas palhinhas.

     "De Natal, nada havia que lembrasse!". Só, ao ligarmos o aparelho de rádio, de vez em quando ouvíamos algumas músicas alusivas.

     E, ali estávamos, naquele sertão africano, e, que fazer, para festejarmos o nosso primeiro Natal em África?

     Depois dos nossos primeiros contactos com os nativos e do nosso óptimo entendimento com eles, foi um "Deus nos ajude!"

     Recorremos directamente à Mãe Natureza, colhemos pedaços de troncos secos, outros de belas árvores em plena pujança, frutos e sementes silvestres em várias cores, e dos pássaros de belas e exóticas plumagens, algumas penas decorativas e tão belas que até hoje conservo algumas de recordação!

     Com os troncos secos armamos um pequeno monte que "maticámos" com barro amassado com água como é normal em África.

     Demos-lhe formas; apareceram relevos, fizemo-lhe uma gruta; num riacho; uma ponte bem típica, com paus secos. Com restos de barro amassado modelámos as figurinhas tradicionais do presépio de Jesus, não faltando os respectivos animais.

     Deixamos secar as nossas esculturas e pintámo-las com tintas obtidas dos produtos da Natureza que colhemos com a ajuda dos nossos novos amigos africanos.

     Desposemos nos devidos lugares tudo o que havíamos construído. O milagre aconteceu! Ali estava o nosso presépio, fruto do nosso trabalho, da nossa criatividade e dos recursos da Natureza!

     Chegou a "Noite de Natal". Fizemos uma abundante Ceia e reunimos os nossos novos amigos e vizinhos africanos. Demos de comer a toda a criançada depois cearam os adultos.

     Houve batuque, música e dançares africanos; (Marrebenta) uma mulher negra saltou ao meio da roda e cantou em língua nativa, cuja tradução é a seguinte:

     "Tu sabes Senhor que eu sou pecadora, a minha religião é a de Maomé.
     Mas eu acredito em Deus e espero que tu me perdoes e tenhas pena de mim!"

     As minhas filhas, então, crianças de 5 e 7 anos encarregaram-se de explicar às crianças negras os símbolos do presépio, tínhamos o intérprete que traduzia tudo!

     Tivemos um Natal de verdade e vivemo-lo em toda a intensidade.

     Pela primeira vez, os nossos novos amigos souberam o que era o Natal de Jesus.

     Foi gratificante ver tanta alegria no olhar dessas crianças e também no olhar dos adultos.

     Foi um Natal de partilha de solidariedade, de encantamento, num local onde: "De Natal nada havia que lembrasse"!

     

Amélia Cunha